
A Gramática da Alma: quando o pensar hesita em ser traduzido
Há momentos em que o pensamento nasce nu, sem sujeito nem predicado — apenas uma vibração interior que se esconde atrás da linguagem.
É aí que a alma hesita.
Não por fraqueza, mas por dignidade.
Recusa a redução do seu voo a frases bem construídas.
Porque o que pensa — pensa em espirais.
E o que sente — sente em silêncio.
A gramática humana, essa grande tecelã de consensos, exige verbos, tempos, regras.
Mas há ideias que não querem tempo.
Há estados que não cabem num verbo.
E há verdades que só se dizem caladas.
Na alma, o pensamento não é linear.
É feito de pausas. De presenças. De ecos que se escutam entre palavras.
Traduzir isso é trair.
É pegar na brisa e tentar colocá-la numa moldura.
Tal como a aritmética não mede o sentir — a gramática não segura o pensar.
Ambas são mapas.
Mas o território…
Ah, o território é feito de outra matéria.
Quem ousa viver entre o número e a palavra, sabe que o espírito não se soma nem se escreve — revela-se.
E cada revelação é uma gaguez sagrada.
Uma falha no código.
Um lampejo de verdade.
A Geometria do Vazio: quando o ser dispensa forma
Nem tudo o que existe precisa de forma.
Há coisas que são. E basta.
O vazio não é ausência — é presença sem contorno.
Um silêncio que resiste à arquitectura.
Uma verdade que recusa ser esculpida.
Ensinam-nos a dar forma a tudo:
A definir.
A descrever.
A delimitar.
Mas o ser — o ser verdadeiro — não vive dentro das linhas.
Respira fora do desenho.
A geometria consola a mente, oferecendo ângulos, bordas, certezas.
Mas a alma?
A alma é horizonte.
Não quer cantos.
Não quer equações.
Quer espaço. Espaço vasto, não medido — onde nada é exigido, e tudo é permitido.
A forma é o compromisso que fazemos com o visível.
Mas no reino da essência, nem a luz tem sombra.
A geometria do vazio não é contradição.
É libertação.
É o regresso ao que antecede qualquer esboço.
E nesse regresso,
Encontramos algo mais profundo do que a forma:
Encontramos presença.
Não desenhada.
Não nomeada.
Não reclamada.
Apenas ser.
